"O Mundo é Minha Paróquia" (John Wesley)
OS SINAIS QUE DISTINGUEM VERDADEIRAS EMOÇÕES ESPIRITUAIS - Parte 2
16/07/2012 17:08Continuação:
5. Emoções espirituais surgem da compreensão espiritual
Emoções espirituais não são calor sem luz. Surgem da iluminação espiritual. O verdadeiro cristão sente porque vê e compreende algo mais sobre as coisas espirituais do que antes. Tem uma visão mais clara e melhor do que antes; ou recebe conhecimento novo da verdade de Deus ou recupera um conhecimento que teve, o qual perdeu. "E também faço esta oração: que o vosso amor aumente ainda mais e mais em pleno conhecimento e toda a percepção" (Fil. 1:9). "Vos revestistes do novo homem que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou" (Col. 3:10).
Neste ponto, quero enfatizar que há uma grande diferença entre o conhecimento doutrinário e conhecimento espiritual. Conhecimento doutrinário envolve somente o intelecto, porém o conhecimento espiritual é um sentimento do coração pelo qual vemos a beleza da santidade na doutrina cristã. Conhecimento espiritual sempre envolve o intelecto e o coração ao mesmo tempo. Precisamos entender intelectualmente o que significa uma doutrina das Escrituras, e degustar a santa beleza desse significado com nosso coração.
É possível ter grande conhecimento das doutrinas no intelecto e ainda assim não ter gosto pela beleza da santidade nessas doutrinas. A pessoa sabe intelectualmente em sua mente, mas não conhece espiritualmente em seu coração. Mero conhecimento doutrinário se assemelha a alguém que viu e tocou o mel. Conhecimento espiritual se assemelha a alguém que sentiu o gosto doce do mel em seus lábios. Este sabe muito mais sobre o mel do que aquele que somente olhou e tocou!
Segue-se que uma compreensão espiritual das Escrituras não significa uma compreensão de suas parábolas, tipos e alegorias. Uma pessoa pode saber interpretar todas estas coisas, sem que tenha tido sequer um raio de luz espiritual em sua alma. "Ainda que eu tenha o dom de profetizar e conheça todos os mistérios e toda a ciência... se não tiver amor, nada serei" (I Cor. 13:2). O "significado espiritual" das Escrituras é a doçura divina de suas verdades, e não a correta interpretação de suas passagens simbólicas.
Mais uma vez, não seria conhecimento espiritual se Deus revelasse imediatamente Sua vontade às nossas mentes pelo Espírito Santo. Tal conhecimento ainda seria doutrinário e, não espiritual. Fatos sobre a vontade de Deus são doutrinas, tanto quanto os fatos sobre a natureza e as obras de Deus! Portanto, ainda estaríamos tratando meramente de conhecimento doutrinário, mesmo supondo que Deus revelasse Sua vontade diretamente às nossas mentes. Revelações diretas não poderiam resultar em nosso conhecimento espiritual, se não tivéssemos uma noção da beleza santa da vontade de Deus.
Quero corrigir outro erro comum sobre a compreensão espiritual. Alguns declaram que Deus lhes revela Sua vontade gravando um texto das Escrituras em suas mentes - muitas vezes um texto sobre um personagem bíblico e sua conduta. Por exemplo, um cristão está tentando decidir se deve ou não ir a um país estrangeiro, onde provavelmente encontrará muitas dificuldades e perigos. As palavras de Deus a Jacó em Gênesis 46:4 vêm poderosamente a sua mente: "Eu descerei contigo para o Egito, e te farei tornar a subir, certamente." Essas palavras se relacionam com Jacó e sua conduta, porém o cristão as interpreta como se se referissem a ele. Interpreta o Egito como o país estrangeiro que tem em mente, e pensa que Deus está prometendo levá-lo ali e trazê-lo de volta em segurança. Pode chamar a isso uma "compreensão espiritual" do texto, ou o Espírito Santo aplicando o texto a ele.
No entanto não há nenhuma coisa de espiritual nisso. Compreensão espiritual percebe o que de fato está nas Escrituras; elas não lhe dão um novo significado. Criar um significado novo para as Escrituras é equivalente a criar novas Escrituras! É acrescentar à Palavra de Deus, uma prática condenada por Deus (Prov. 30:6). O verdadeiro significado espiritual das Escrituras é aquele que teve originalmente, quando o Espírito a inspirou. Esse significado original é aquele que todos poderiam ver, se não estivessem espiritualmente cegos.
Sem dúvida estas experiências geram emoções ardentes. É claro que as pessoas se sentem muito emocionadas quando pensam que Deus as está guiando dessa forma por um texto, ou revelando a elas a Sua vontade diretamente pelo Espírito. O que quero dizer, entretanto,é o seguinte: nenhuma dessas experiências consiste num sentido ou gosto pela beleza da santidade de Deus. Além disso, emoções são espirituais somente quando resultam dessa visão espiritual da beleza da santidade de Deus. Se emoções surgem meramente de sugestões na mente, ou palavras vindo à cabeça, não são de natureza espiritual.
Grande parte da religião falsa no mundo se compõe dessas experiências e das falsas emoções que propiciam. Religiões não cristãs estão repletas delas. Assim, desafortunadamente, é a história da Igreja. Estas experiências cativam as pessoas, especialmente as de menor inteligência; pensam que o cristianismo se resume nessas impressões, visões e êxtases. Logo, satanás se transforma num anjo de luz, engana às multidões e corrompe a verdadeira religião. Líderes da Igreja devem estar constantemente de sobreaviso em relação a esses enganos, especialmente em tempos de avivamento.
Antes de prosseguir, quero deixar uma coisa clara. Eu não quero ser mal entendido no que afirmei. Não estou dizendo que emoções não são espirituais somente por serem acompanhadas de idéias imaginárias. A natureza humana é tal que não podemos pensar intensamente sobre algo sem ter algum tipo de idéia imaginária. No entanto, se nossas emoções resultam dessas idéias imaginárias e não de nosso conhecimento espiritual, então nossas emoções não têm valor espiritual. Quero que tenham essa diferença em mente: idéias imaginárias podem surgir de emoções espirituais, mas emoções espirituais não podem surgir de idéias imaginárias. Emoções espirituais só podem redundar do entendimento espiritual, isto é, da ótica do coração que vê a beleza da santidade. Se idéias imaginárias acompanham uma verdadeira emoção espiritual, não são essenciais a ela, todavia são um efeito acidental.
6. Emoções espirituais trazem uma convicção da realidade das coisas divinas
Lembrem-se do texto das Escrituras no início deste livro: "a quem, não havendo visto, amais; no qual, não vendo agora, mas crendo, exultais com alegria indizível e cheia de glória " (I Ped. 1:8).
O verdadeiro cristão tem uma convicção sólida e efetiva da verdade do evangelho. Não hesita mais entre duas opiniões. O evangelho deixa de ser duvidoso ou provavelmente verdadeiro, tornando-se estabelecido e indiscutível em sua mente. As coisas grandes, espirituais, misteriosas e invisíveis do evangelho influenciam seu coração como realidades poderosas. Ele não tem simplesmente uma opinião que Jesus seja o Filho de Deus; Deus abre seus olhos para ver que este é o caso. Quanto às coisas que Jesus ensina sobre Deus, a vontade de Deus, a salvação e o céu, o cristão também sabe que são realidades indubitáveis. Têm, assim, uma influência prática em seu coração e em seu comportamento.
É claro nas Escrituras que todos os verdadeiros cristãos têm essa convicção sobre as coisas divinas. Mencionarei somente alguns textos dos muitos existentes: "Mas vós... quem dizeis que eu sou?" "Respondendo Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, o filho do Deus vivo. Então Jesus lhe afirmou: bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue quem to revelou, mas meu Pai que está nos céus" (Mat. 16:15-17). "Manifestei o teu nome aos homens que me deste do mundo. Eram teus, tu mos confiaste, e eles têm guardado a tua palavra. Agora eles reconhecem que todas as coisas que me tens dado, provêm de ti; porque eu lhes tenho transmitido as palavras que me deste e eles as receberam e verdadeiramente conheceram que saí de ti, e creram que tu me enviaste" (João 17:6-8). "Porque sei em quem lenho crido, e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito até aquele dia" (II Tim. 1:12). "E nós conhecemos e cremos 0 amor que Deus nos tem" (I João 4:16).
Existem muitas experiências religiosas que falham em trazer essa convicção. Muitas das chamadas revelações são emocionantes, mas não convincentes. Não produzem mudança duradoura na atitude e conduta da pessoa. Existem pessoas que têm tais experiências, todavia não agem sob influência prática de uma convicção das realidades infinitas, eternas em suas vidas diárias. Suas emoções Urdem por algum tempo e depois morrem de novo, não deixando atrás de si nenhuma convicção duradoura.
Entretanto, suponhamos que as emoções religiosas de uma pessoa surjam realmente de uma forte convicção que o cristianismo é verdadeiro. Seriam suas emoções espirituais? Não, não necessariamente. De fato, suas emoções ainda não são espirituais, a não ser que sua convicção seja razoável. Por "uma convicção razoável", quero dizer uma convicção fundada em evidência e de bom entendimento. Pessoas de outras crenças têm uma forte convicção da verdade de suas religiões. Muitas vezes aceitam suas religiões meramente porque seus pais, vizinhos e nações as ensinam. Se um cristão professo não tem outra base para sua fé, a não ser essa, sua religião não é melhor do que a de qualquer outro que creia meramente como resultado de sua formação. Sem dúvida a verdade em que o cristão acredita é melhor, porém se sua crença nessa verdade vem somente de sua formação, então a crença em si mesma está no mesmo nível que aquela das pessoas de outras religiões. As emoções que fluem de tal crença não são melhores que as emoções religiosas fundadas em outras crenças.
Além disso, suponhamos que a crença de uma pessoa no cristianismo não seja baseada em sua educação, mas em argumentos e na razão. Seriam suas emoções agora espirituais? Mais uma vez, não necessariamente. Emoções não espirituais podem surgir até de uma crença razoável. A crença propriamente dita há de ser espiritual bem como razoável. De fato, argumentos racionais às vezes convencerão uma pessoa intelectualmente que o cristianismo é verdadeiro, no entanto aquela pessoa continua não salva. Simão, o mágico, cria intelectualmente (At. 8:13), porém, continuou "em fel de amargura e laço de iniqüidade" (At. 8:23). Crença intelectual certamente pode produzir emoções, como nos demônios que "crêem e tremem" (Tg. 2:19), todavia tais emoções não são espirituais.
Convicção espiritual da verdade surge somente numa pessoa espiritual. Somente quando o Espírito de Deus ilumina nossas mentes para entender realidades espirituais podemos ter uma convicção espiritual da verdade delas. Lembrem-se, compreensão espiritual significa uma percepção interior da beleza espiritual das coisas divinas. Descreverei agora como essa compreensão nos convence da veracidade dessas coisas.
Deus é único. É totalmente diferente de outros seres e mais do que qualquer outro atributo divino, é a beleza de Deus que O distingue. Essa beleza é totalmente diversa de todas as outras belezas. Assim, quando o cristão a encontra no cristianismo, ele vê Deus aí. Vê a beleza divina, a qual é a principal característica distinguidora de Deus. Isto dá ao cristão um conhecimento direto, intuitivo que o evangelho de Cristo vem de Deus. Ele não precisa ser persuadido por longos e complicados argumentos. O argumento é simples: ele percebe a verdade do evangelho porque vê sua beleza e glória divinas.
Muitas das verdades mais importantes do evangelho dependem de sua beleza espiritual. Uma vez que o homem natural não pode ver essa beleza, não é de admirar que não acredite nelas. Deixem-me dar alguns exemplos. A não ser que vejamos a beleza da santidade, estaremos cegos para a fealdade do pecado. Conseqüentemente, não entenderemos o modo como as Escrituras condenam o pecado, nem o que dizem sobre a terrível pecaminosidade da humanidade. Somente aquele a quem o Espírito Santo der essa habilidade de provar a doçura da santidade e o amargor do pecado pode ver e sentir a terrível depravação de seu próprio coração. Só dessa forma ficamos convencidos que as Escrituras falam a verdade sobre a corrupção da natureza humana, sobre a necessidade do homem de ter um Salvador e quanto ao grandioso poder de Deus para mudar e renovar o coração humano. Isso nos convence também que Deus é justo ao punir tão severamente o pecado e que o homem é incapaz de expiar seu próprio pecado. Esse sentido de beleza espiritual permite que a alma veja a glória de Cristo, conforme as Escrituras O revelam. Compreendemos 0 infinito valor de Sua expiação e a excelência do caminho da salvação no evangelho. Vemos que a felicidade do homem consiste na santidade e sentimos a glória indescritível do céu. A verdade de todas essas coisas mostra-se à alma somente quando esta recebe o sentido espiritual da beleza divina de que tenho falado.
Se a convicção da verdade do evangelho não puder surgir a partir desse sentido de sua beleza divina, a maior parte das pessoas jamais lerá qualquer crença nessa verdade. Estudiosos e acadêmicos podem crer com base na evidência histórica, mas isto não está ao alcance da maioria de nós. A evidência histórica exige um conhecimento de muitos escritos históricos fora das Escrituras. Comparando esses escritos com as Escrituras é possível ver quão confiável ela é em seu relato histórico dos povos e dos eventos. Mesmo assim, quem fará esse estudo, exceto os estudiosos? Se um incrédulo tiver que se tornar historiador antes de se tornar um cristão, quantos se tornarão cristãos? Será necessário que percorramos o laborioso processo de estudar escritos históricos não escriturísticos, antes de crermos neles? Teria Deus realmente dificultado tanto nossa possibilidade de convicção razoável da verdade de Seu evangelho?
O fato é que poucas pessoas realmente crêem desse modo. Muitos dos cristãos do passado eram iletrados, mas ainda assim creram, e creram corretamente. A fé deles não dependeu do que os estudiosos e historiadores lhes disseram. Se isso tivesse acontecido, teria sido meramente uma opinião humana e não a completa segurança exigida pela Palavra de Deus. "Aproximemo-nos, com sincero coração, em plena certeza de fé" (Heb. 10:22). "Para que os seus corações sejam confortados, vinculados juntamente em amor, e tenham toda riqueza da forte convicção do entendimento, para compreenderem plenamente o mistério de Deus, Cristo" (Col. 2:2). Não podemos obter esse tipo de certeza a partir do que os estudiosos e historiadores nos dizem. Contudo, Deus mesmo no-la dá. Ele abre nossos olhos para vermos as indizíveis beleza e glória divinas que brilham no Seu evangelho. Vemos Deus ali. Essa evidência nos convence totalmente. O homem natural pode ser cego a ela, como uma pessoa inculta é cega para a beleza da poesia erudita. O cristão espiritual, entretanto, vê, aprova e aprecia essa maravilhosa glória divina do evangelho, que dissolve todas as suas dúvidas, convencendo-o de ser a verdade.
Não estou dizendo que todo cristão sente o mesmo grau de certeza espiritual o tempo todo. Obtemos segurança da verdade do evangelho à medida em que vemos sua beleza divina, mas às vezes nossa visão se torna turva. O que precisamos é uma visão cada vez mais clara dessa beleza divina do cristianismo, se nossa segurança há de ser intensa e poderosa.
Ora, novamente não estou dizendo que a evidência histórica,bem como outros argumentos em relação ao cristianismo sejam inúteis. Deveríamos atribuir-lhes grande valor; podem impelir o incrédulo a levar o cristianismo a sério. Podem confirmar a fé dos crentes. O que não podem fazer é produzir certeza espiritual. Somente uma visão da beleza espiritual e glória divina das coisas pode fazer isso.
7. Emoções espirituais sempre coexistem com a humilhação espiritual
Humilhação espiritual é o sentimento que tem o cristão de quanto é suficiente e detestável, levando-o a rebaixar-se e exaltar somente a Deus. Ao mesmo tempo, há um outro tipo de humilhação que podemos chamar de humilhação legal. Humilhação legal é uma experiência que somente os incrédulos podem ter. A lei de Deus opera em suas consciências, fazendo com que percebam quão pecaminosos e inúteis são. Entretanto, não vêem a natureza odiosa do pecado, nem renunciam o pecado em seus corações, nem se rendem a Deus. Sentem-se como que forçados a serem humildes, mas não têm humildade. Sentem o que todas as pessoas más e diabólicas sentirão no Dia do Juízo - condenados, humilhados e forçados a admitir que Deus está certo, porém continuam não convertidos.
Humilhação espiritual, por outro lado, brota do sentido que o verdadeiro cristão tem da beleza e glória da santidade de Deus. Faz com que sinta quão vil e desprezível é em si mesmo devido à sua iniqüidade. Leva-o a se prostrar voluntária e alegremente perante os pés de Deus, negando a si mesmo e renunciando a seus pecados.
Humilhação espiritual é da essência da verdadeira religião. Aqueles que carecem dela não são cristãos verdadeiros, não importa quão maravilhosas possam ser suas experiências. As Escrituras são bem completas em seu testemunho da necessidade dessa humilhação: "Perto está o Senhor dos que têm o coração quebrantado, e salva os de espírito oprimido" (Sal. 34:18). "Sacrifícios agradáveis a Deus são 0 espírito quebrantado; coração compungido e contrito não o desprezarás, ó Deus" (Sal. 51:17). "Assim diz o Senhor: o céu é o meu trono, a terra o estrado dos meus pés ... mas o homem para quem olharei é este: o aflito e abatido de espírito, e que treme da minha palavra" (Is. 66:1-2). "Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus" (Mat. 5:3). Vejam também a parábola do fariseu e do publicano, Luc. 18:9-14.
Humilhação espiritual é a essência da auto-negação cristã. Consiste em duas partes. Primeiro, um homem deve negar suas inclinações mundanas e renunciar a todos os prazeres pecaminosos. Em segundo lugar, deve negar à sua natural concentração em si mesmo e auto-afirmação. Essa segunda parte é a mais fácil de realizar. Muitos fizeram a primeira sem atingir a segunda; rejeitaram os prazeres físicos, somente para sentir o prazer diabólico do orgulho.
É claro, hipócritas orgulhosos fingem ser humildes, porém geralmente interpretam mal esse papel. Sua humildade geralmente consiste em dizer aos outros como são humildes. Dizem coisas como: "Sou o menor de todos os santos", "Sou uma pobre e vil criatura", "Meu coração é pior que o diabo", etc. Dizem essas coisas e ainda assim esperam que os outros os vejam como santos notáveis. Se outra pessoa dissesse sobre o hipócrita as mesmas coisas que ele diz sobre si mesmo, como ficaria ofendido!
Orgulho espiritual pode ser muito sutil, disfarçando-se como humildade, mas existem dois sinais que evidenciam sua presença:
(i) O homem orgulhoso compara a si mesmo com os outros nas coisas espirituais, e tem uma opinião exaltada sobre si mesmo. Está ansioso por liderança entre o povo de Deus, e deseja que sua opinião seja lei para todos. Quer que os outros cristãos tenham-no como exemplo e o sigam em questões de religião.
O homem verdadeiramente humilde é o oposto disso. Sua humildade faz com que pense que os outros são melhores do que ele mesmo (Fil. 2:3). Não é normal que tome sobre si mesmo o posto do professor, pois pensa que outros estão mais preparados que ele, como fez Moisés (Ex. 3:11-4:7). Está mais ansioso por ouvir do que por falar (Tg. 1:19). E quando fala, não é de modo ousado e auto-confíante, e sim com temor. Não aprecia exercer poder sobre os outros, preferindo seguir a liderar.
(ii) Outro sinal certo de orgulho espiritual é que o homem orgulhoso tende a pensar muito bem de sua humildade, enquanto o homem verdadeiramente humilde pensa que é muito orgulhoso!
Isso decorre de o homem orgulhoso e o humilde terem diferentes pontos de vista sobre si mesmos. Medimos a humilhação de um homem por nossos pontos de vista sobre a dignidade e grandeza que lhes são próprias. Se um rei se ajoelhasse para tirar o sapato de outro rei, consideraríamos isso um ato de rebaixar a si mesmo, assim como sentiria o rei que o tirou. Em contraste, se um escravo se ajoelhasse para remover o sapato de um rei, ninguém pensaria ter sido esse um ato de grande rebaixamento, ou sinal de grande humildade. O próprio escravo não pensaria isso, a não ser que fosse ridiculamente cheio de si. Se depois o escravo saísse alardeando da grande humildade que demonstrou ao remover o sapato do rei, todos ririam dele! "Quem você pensa que é, diriam, para supor ter sido humilde ao tirar o sapato do rei?"
O homem orgulhoso é como o escravo cheio de si. Pensa ser um grande sinal de humildade confessar sua indignidade perante Deus. Isso decorre de ter um alto conceito de si mesmo. Quão humilde ele é ao confessar sua indignidade! Se tivesse uma visão apropriada de si mesmo, iria antes se sentir admirado e envergonhado de não ser mais humilde perante Deus.
O homem verdadeiramente humilde nunca sente que se rebaixou o suficiente perante Deus. Sente que não importa quanto se proste, poderia prostrar-se ainda mais. Sempre sente que está acima de sua posição própria perante Deus. Olha para sua posição e para aquela onde deveria estar, e parece estar a uma grande distância dessa. Chama à distância "orgulho". É seu orgulho que lhe parece ser grande, não sua humildade. Não parece para ele ser um grande sinal de sua humildade que se deite no pó aos pés de Deus. Ele pensa que é exatamente onde deve estar.
Leitor, não se esqueça de aplicar estas coisas a você mesmo. Acaso você fica ofendido quando alguém pensa que é um cristão melhor do que qualquer outro? Pensa que essa pessoa é orgulhosa e que você é mais humilde que ela? Então tenha cuidado, caso que se torne orgulhoso de sua humildade! Examine a si mesmo. Se concluir, "Parece-me que ninguém é tão pecador quanto eu", não fique satisfeito com isso. Você pensa ser melhor do que os outros por admitir que é tão pecador? Tem uma alta opinião dessa sua humildade? Se você diz: "Não, eu não tenho uma opinião elevada de minha humildade, penso que sou tão orgulhoso quanto o diabo'", então examine-se de novo. Porventura você está orgulhoso do fato que não tem uma opinião elevada sobre sua humildade? Você pode ter orgulho de admitir quão orgulhoso você é!
8. Emoções espirituais sempre coexistem com uma mudança de natureza
Todas as emoções espirituais surgem de uma compreensão espiritual, na qual a alma vê a excelência e glória das coisas divinas. Essa visão espiritual tem um efeito transformador. "E todos nós com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito" (II Cor. 3:18). Este poder transformador vem somente de Deus - do Espírito do Senhor.
As Escrituras descrevem a conversão em termos que implicam ou significam uma mudança de natureza: nascer de novo, tornar-se novas criaturas, levantar-se dos mortos, ser renovado em espírito e na mente, morrer para o pecado e viver para a retidão, descartando o homem velho e vestindo o novo, partilhar da natureza divina, e assim por diante.
Segue-se que se não há mudança real e duradoura nas pessoas que pensam estar convertidas, então sua religião não têm nenhum valor, não importa quais tenham sido suas experiências. A conversão é o volver do homem total do pecado para Deus. É claro que Deus pode impedir as pessoas não convertidas de pecar, todavia na conversão Ele volve o próprio coração e sua natureza do pecado para a santidade. A pessoa convertida se torna uma inimiga do pecado. O que, então, podemos pensar de alguém que diz ter tido uma experiência de conversão, mas cujas emoções religiosas logo morrem, deixando-o muito parecido com a pessoa que foi antes? Ele parece egoísta, mundano, tolo, perverso e não cristão como sempre. Isso fala contra ele mais alto do que qualquer experiência religiosa possa falar a favor dele. Em Jesus Cristo, não importam circuncisão ou incircuncisão, experiência dramática ou silenciosa, testemunho maravilhoso ou enfadonho. A única coisa que importa é uma nova criação.
E claro que devemos levar em conta o temperamento natural dos indivíduos. A conversão não destrói o temperamento natural. Se nosso temperamento faz com que sejamos inclinados a certos pecados antes de nossa conversão, muito possivelmente tenderemos aos mesmos pecados depois da conversão. Entretanto, a conversão fará alguma diferença até nesse ponto. Embora a graça de Deus não destrua as falhas de temperamento, pode corrigi-las. Se um homem antes de sua conversão era inclinado por seu temperamento natural à lascívia, bebedeira ou vingança, sua conversão terá um poderoso efeito sobre essas inclinações más. Ainda pode correr perigo desses pecados, mais que quaisquer outros, porém eles não dominarão sua alma e sua vida como fizeram antes. Não serão mais parte de seu verdadeiro caráter. De fato, arrependimento sincero fará com que uma pessoa odeie e tema particularmente os pecados dos quais foi exteriormente mais culpado.
Continue no próximo dia...
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